"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sexta-feira, 31 de julho de 2015


ela não é louca, você que não está apaixonado


Só a paixão absolve a loucura.

Se não estiver apaixonado, não aceitará que a pessoa ligue 10 vezes ao dia, mande centenas de mensagens simultâneas no Facebook e no WhatsApp, pergunte onde você está e o que anda fazendo, que partilhe música favorita e fique angustiada até aparecer o aviso de que você ouviu.

Entenderá que ela está perseguindo, é uma doente, uma carente, uma histérica, não tem com o que se preocupar. Vai descartar o caso confiando que se livrou de uma roubada.

Mas, se estiver apaixonado, achará tudo adequado e preciso, que ninguém compreendeu sua rapidez antes, compreenderá a insistência como dedicação. Responderá as mensagens no mesmo instante, não deixará nada no vácuo, elogiará as afinidades, dedicará o pior do seu tempo para corresponder às expectativas, e ainda sofrerá de ansiedade diante de qualquer minuto de silêncio jurando que é o fim do relacionamento.

Somos todos loucos hoje em dia. Não há mais ninguém normal. Todos têm traumas, ou perderam um pai ou uma mãe, ou não se dão com a família, ou têm alguma crise de pânico ou um desajuste profissional. Saúde de verdade somente depois de morto, e ninguém voltou para se exibir, com exceção de Jesus, que retornou falando qualquer idioma – até a língua portuguesa – e muito melhor do que realmente estava.

Se você não admite o comportamento alheio, não tem nada a ver com a possível psicopatia do sujeito, é apenas porque não está apaixonado.

A paixão isenta a loucura. O apaixonado é um possuído, um abnegado, extravia a noção da realidade para apressar as fantasias. Não se interessa em conceituar o que é certo ou errado, mas em se aproximar cada vez mais, mesmo que seja necessário transgredir suas leis e hábitos. Não julgará, pois o julgamento é próprio da razão e do discernimento.

Uma festa será a melhor dança da vida. Uma conversa na cozinha será a melhor confissão da vida. Um cinema será o melhor encontro a dois da vida. O sexo no sofá será o mais íntimo da vida.

O banal será sublime. O pouco será muito. O recente será eterno.

O apaixonado superfatura as vivências. Exagera. Extrapola. Transborda. Cobre seus olhos de tarja preta, não lê prontuários médicos, muito menos revisa o passado de sua companhia.

E, quando chegar o amor, após a paixão, não descobrirá o quanto seu par é realmente irritante e insuportável.

Conhecerá uma nova doideira. A doideira da intimidade e da paciência. A doideira dos defeitos e da imperfeição. A doideira da raiva e da desculpa. Não enxergará a implicância incorrigível do seu marido ou de sua esposa. Conhecerá em si um fôlego incansável para brigar e discutir noite adentro, e uma indisposição incomum para acordar na manhã seguinte e logo esquecer as diferenças e mágoas.

Só o amor perdoa a chatice.


Não pense que escrevo aqui o meu mais íntimo segredo, pois há segredos que não conto nem a mim mesma.

maturidade


– Zezê, não gostei do gosto desse milho branquinho.
– É uma espiga mais novinha, menino, por isso ele é branquinho assim.
– Troca pra mim por um milho mais adulto?

(Cris, em Francisquices)

“... eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo.”

Gênesis  4:6-7

quinta-feira, 30 de julho de 2015

contigo e sentigo



Sabemos como foi uma paixão pelo modo como ela termina. Essa frase está no livro O Passado, do argentino Alan Pauls, mas não precisaria estar em livro nenhum para que a avalizássemos. A maneira como se coloca o ponto final nas relações deixa evidente o verdadeiro espírito que norteou o que foi vivido.

Que tipo de final desejamos? De preferência, nenhum. Todos querem um amor para sempre, desde que ele se mantenha estimulante, surpreendente, à prova de tédio. Ou seja, um amor miraculoso. Como milagre é do departamento das coisas impossíveis, é natural que as relações durem alguns anos ou muitos anos, e depois acabem. Lei da vida.

Sofre-se o diabo, mas raros são aqueles que nunca passaram por isso. O que fazer para amenizar a dor? Talvez ajude se analisarmos o final para entender como foi o durante.
Há os finais chamados civilizados. Ambos os envolvidos percebem o desgaste do relacionamento, conversam, tentam mais um pouco, conversam novamente, arrastam a história mais uns meses, veem que nada está melhorando, aguardam passar o Natal e o Ano-Novo, fazem uma última tentativa e então decidem: fim. Lógico que é dilacerante. 

Não é fácil fazer uma mala, dividir os pertences e estipular visitas aos filhos, quando há filhos. A solidão espreita e assusta, e um restinho de dúvida sempre surge na hora do abraço de despedida. Mas foi um the end sem derramamento de sangue. Como conseguiram a façanha?
Provavelmente porque sempre escutaram um ao outro, porque não fizeram da relação um campo minado, porque as brigas eram exceções e não regra. É possível também que a relação fosse mais racional do que animal: ternura é bem diferente de paixão. Mas, enfim, mesmo sofrendo com a ruptura, deram a ela um fim digno, condizente com o que de bacana viveram juntos.

Agora vamos ao outro tipo de separação. Tire as crianças da sala.

A relação acaba geralmente depois de um ataque de ofensas, de uns “não aguento mais”, de muita choradeira, de cortes na alma, de desconstrução total. Garanto que se amam mais do que aquele casal que se separou assepticamente, mas perderam toda a paciência um com o outro, e também todo o respeito, e atingiram um limite difícil de transpor. Por que, depois desse quebra-quebra, não tentam um papo conciliador? Ora, porque não fazem a mínima ideia do que seja isso. Sempre foram atormentados pelo ciúme, pelas implicâncias diárias, pela alternância de “te amo” e “te odeio”. Terminam falando mal um do outro para quem quiser ouvir, e não raro aprontam umas vingançazinhas. Tudo muito longe do sublime.

Tive um vizinho que gritava com a namorada ao telefone, sem se importar que o prédio inteiro ouvisse: “Não sei o que fazer! Fico mal contigo e fico mal sentigo!”. Sempre achei essa situação desoladora, e nem estou falando do português do sujeito. É duro ter apenas duas alternativas (ficar ou ir embora) e ambas serem terríveis.

Quando acaba docemente, é sinal de que você foi feliz e nada há para se lamentar. Se acaba de forma azeda, é porque a relação era mesmo uma neura e tampouco se deve lamentar. Nos dois casos, a performance final ao menos ajuda a compreender o que foi vivido e a se preparar para um novo amor que não acabe nunca. Em tese.


Paz é que nem calcinha, 
não deixe qualquer um tirar a sua.



Cérebro podia virar modinha também.
Aí todo mundo usava.

___Samuel Rodrigo

“O orgulho vem antes da destruição; o espírito altivo, antes da queda.” 

(Provérbios 16:18)

quarta-feira, 29 de julho de 2015


Toda mulher bonita não se acha bonita. Mesmo a mais bonita.

É alguma coisa que não agrada: a orelha, o pé, a mão. São detalhes imperceptíveis para a tripulação barbuda. Ou as veias estão muito saltadas ou as unhas quebram rápido.
Uma coisinha que somente ela nota.

E ela sofre duas vezes: quando alguém descobre e quando ninguém enxerga.
A segunda opção é a mais triste. Caso o problema passar despercebido, partirá do princípio de que é tão insignificante que não merece a atenção dos outros.

Toda mulher se vê filha única do defeito. E não é um defeito, mas uma cisma. A maior parte dos defeitos é superstição.
Talvez o martírio feminino venha do excesso de controle: ela se olha demais, e tudo ganha o dobro de importância. O homem se olha de menos, e nunca teve estrias e celulite.
Para a mulher, espelho é lupa. Para o homem, espelho é janela.

Uma espinha, por exemplo, quando descoberta por uma mulher torna-se o próprio rosto. O rosto não existe mais, somente a espinha, que é alisada a cada preocupação.

Mulher não se acha realmente bonita. Nem Brigitte Bardot antes. Nem Gisele Bündchen agora.
Mulher nenhuma no mundo é vaidosa; vaidade é a confirmação de um atributo e ela desconhece suas qualidades.
Mulher nenhuma acredita que é bonita, apenas disfarça que é bonita.

O elogio que recebe soa como ironia. A ausência de elogio soa como reclamação.

Arrumar-se de manhã para a mulher não é um prazer, e sim um pânico.
No fundo, ela se considera um encalhe. Jura que qualquer novo amor é resultado de compaixão ou cegueira masculina.

Mulher não nasce bonita, torna-se provisoriamente bonita (em sua concepção, a beleza dura apenas um dia).
Ela se monta por 24h, mais do que isso não consegue: carrega o medo de se desmanchar com a luz e desiludir a expectativa do próximo.
Seus cuidados são vinganças: à infância, ao deboche da família, ao bullying na escola.
Dentro dela, ela continua uma nerd. Guardará para sempre a imagem de menina inteligente e problemática, de gorda balofa, de desengonçada e fora do time, de alta girafa, de sardenta enferrujada, de vesga fundo de garrafa.

Não adianta convencê-la de que ela é linda, ela se acorda despenteada e nasce de novo, como se não tivesse vivido antes.
Não é falsa modéstia, sequer é modéstia, ela se percebe feia. Toda mulher bonita acredita que, no máximo, pode se ajeitar.
Em seus olhos, corre uma insatisfação permanente que não permite descanso e luto.
Se seus cabelos são lisos, ela gostaria que fossem cacheados; se são cacheados gostaria que fossem ondulados, se são ondulados gostaria que fossem crespos.

A beleza é uma conclusão. E toda mulher vive de dúvidas, toda mulher é uma pergunta.
Uma insaciável pergunta.


Finalmente, alguém que fala bolacha...


Eu achava que religião não era para garantir o céu, depois da morte, mas para tornar esse mundo melhor, enquanto estamos vivos...


Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração, prova-me e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno.

Salmos 139:23-24

terça-feira, 28 de julho de 2015


tudo que vicia começa com c



Por alguma razão que ainda desconheço, minha mente foi tomada por uma ideia um tanto sinistra: vícios.

Refleti sobre todos os vícios que corrompem a humanidade. Pensei, pensei e,de repente, um insight: tudo que vicia começa com a letra C!De drogas leves a pesadas, bebidas, comidas ou diversões, percebi que todo vício curiosamente iniciava com cê.Inicialmente, lembrei do cigarro que causa mais dependência que muita droga pesada. Cigarro vicia e começa com a letra c.

Depois, lembrei das drogas pesadas: cocaína, crack e maconha. Vale lembrar que maconha é apenas o apelido da cannabis sativa que também começa com cê.
Entre as bebidas super populares há a cachaça, a cerveja e o café. Os gaúchos até abrem mão do vício matinal do café mas não deixam de tomar seu chimarrão que também – adivinha – começa com a letra c.

Refletindo sobre este padrão, cheguei à resposta da questão que por anos atormentou minha vida: por que a Coca-Cola vicia e a Pepsi não? Tendo fórmulas e sabores praticamente idênticos, deveria haver alguma explicação para este fenômeno. Naquele dia, meu insight finalmente revelara a resposta. É que a Coca tem dois cês no nome enquanto a Pepsi não tem nenhum.

Impressionante, hein?

E o computador e o chocolate? Estes dispensam comentários. Os vícios alimentares conhecemos aos montes, principalmente daqueles alimentos carregados com sal e açúcar. Sal é cloreto de sódio. E o açúcar que vicia é aquele extraído da cana.

Algumas músicas também causam dependência. Recentemente, testemunhei a popularização de uma droga musical chamada “créeeeeeu”. Ficou todo o mundo viciadinho, principalmente quando o ritmo atingia a velocidade… cinco.

Nesta altura, você pode estar pensando: sexo vicia e não começa com a letra C. Pois você está redondamente enganado. Sexo não tem esta qualidade porque denota simplesmente a conformação orgânica que permite distinguir o homem da mulher. O que vicia é o “ato sexual”, e este é denominado coito.

Pois é. Coincidências ou não, tudo que vicia começa com cê. Mas atenção: nem tudo que começa com cê vicia. Se fosse assim, estaríamos salvos pois a humanidade seria viciada em Cultura.


De repente, apetece-nos dormir do lado contrário da cama. 
Passamos a gostar de café sem açúcar. E de favas! 
Já não vivemos para a noite e preferimos aproveitar os raios do sol. 
Descartamos quem só estava ali por diversão e restringimos aos que nos dão a mão. Deixamos de nos preocupar só com nós próprios e precisamos que o outro esteja bem. Aprendemos a sorrir só porque sim. 
Percebemos que mostrar sentimentos é uma coisa boa. Percebemos que mudamos em muita coisa, ainda que sendo a mesma pessoa. 
E que é tão mais fácil viver assim.

___Rita Leston

Porventura pode uma mulher esquecer-se tanto de seu filho que cria, que não se compadeça dele, do filho do seu ventre? Mas ainda que esta se esquecesse dele, contudo eu não me esquecerei de ti.

Isaías 49:15

segunda-feira, 27 de julho de 2015

visitando a vovó


#tempos modernos

da arte de ser avó


Netos são como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de repente lhe caem do céu. É, como dizem os ingleses, um ato de Deus. 
Sem se passarem as penas do amor, sem os compromissos do matrimônio, sem as dores da maternidade. E não se trata de um filho apenas suposto, como o filho adotado: o neto é realmente o sangue do seu sangue, filho de filho, mais filho que o filho mesmo.

Quarenta anos, quarenta e cinco... Você sente, obscuramente, nos seus ossos, que o tempo passou mais depressa do que esperava. Não lhe incomoda envelhecer, é claro. A velhice tem as suas alegrias, as suas compensações - todos dizem isso embora você, pessoalmente, ainda não as tenha descoberto - mas acredita. Todavia, também obscuramente, também sentida nos seus ossos, às vezes lhe dá aquela nostalgia da mocidade. Não de amores nem de paixões: a doçura da meia-idade não lhe exige essas efervescências.

A saudade é de alguma coisa que você tinha e lhe fugiu sutilmente junto com a mocidade. Bracinhos de criança no seu pescoço. Choro de criança. O tumulto da presença infantil ao seu redor. Meu Deus, para onde foram as suas crianças? Naqueles adultos cheios de problemas que hoje são os filhos, que têm sogro e sogra, cônjuge, emprego, apartamento a prestações, você não encontra de modo nenhum as suas crianças perdidas. São homens e mulheres - não são mais aqueles que você recorda. 

E então, um belo dia, sem que lhe fosse imposta nenhuma das agonias da gestação ou do parto, o doutor lhe põe nos braços um menino. Completamente grátis - nisso é que está a maravilha. Sem dores, sem choro, aquela criancinha da sua raça, da qual você morria de saudades, símbolo ou penhor da mocidade perdida. Pois aquela criancinha, longe de ser um estranho, é um menino seu que lhe é “devolvido”. E o espantoso é que todos lhe reconhecem o seu direito de o amar com extravagância; ao contrário, causaria escândalo e decepção se você não o acolhesse imediatamente com todo aquele amor recalcado que há anos se acumulava, desdenhado, no seu coração. 

Sim, tenho certeza de que a vida nos dá os netos para nos compensar de todas as mutilações trazidas pela velhice. São amores novos, profundos e felizes que vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, deixado pelos arroubos juvenis. Aliás, desconfio muito de que netos são melhores que namorados, pois que as violências da mocidade produzem mais lágrimas do que enlevos. Se o Doutor Fausto fosse avó, trocaria calmamente dez Margaridas por um neto.

No entanto - no entanto! - nem tudo são flores no caminho da avó. Há, acima de tudo, o entrave maior, a grande rival: a mãe. Não importa que ela, em si, seja sua filha. Não deixa por isso de ser a mãe do garoto. Não importa que ela, hipocritamente, ensine o menino a lhe dar beijos e a lhe chamar de “vovozinha”, e lhe conte que de noite, às vezes, ele de repente acorda e pergunta por você. São lisonjas, nada mais. No fundo ela é rival mesmo. Rigorosamente, nas suas posições respectivas, a mãe e a avó representam, em relação ao neto, papéis muito semelhantes ao da esposa e da amante dos triângulos conjugais. A mãe tem todas as vantagens da domesticidade e da presença constante. Dorme com ele, dá-lhe de comer, dá-lhe banho, veste-o. Embala-o de noite. Contra si tem a fadiga da rotina, a obrigação de educar e o ônus de castigar.

Já a avó, não tem direitos legais, mas oferece a sedução do romance e do imprevisto. Mora em outra casa. Traz presentes. Faz coisas não programadas. Leva a passear, “não ralha nunca”. Deixa lambuzar de pirulitos. Não tem a menor pretensão pedagógica. É a confidente das horas de ressentimento, o último recurso nos momentos de opressão, a secreta aliada nas crises de rebeldia. Uma noite passada em sua casa é uma deliciosa fuga à rotina, tem todos os encantos de uma aventura. Lá não há linha divisória entre o proibido e o permitido, antes uma maravilhosa subversão da disciplina. Dormir sem lavar as mãos, recusar a sopa e comer roquetes, tomar café - café! -, mexer no armário da louça, fazer trem com as cadeiras da sala, destruir revistas, derramar a água do gato, acender e apagar a luz elétrica mil vezes se quiser - e até fingir que está discando o telefone. Riscar a parede com o lápis dizendo que foi sem querer - e ser acreditado! Fazer má-criação aos gritos e, em vez de apanhar, ir para os braços da avó, e de lá escutar os debates sobre os perigos e os erros da educação moderna.

Sabe-se que, no reino dos céus, o cristão defunto desfruta os mais requintados prazeres da alma. Porém, esses prazeres não estarão muito acima da alegria de sair de mãos dadas com o seu neto, numa manhã de sol. E olhe que aqui embaixo você ainda tem o direito de sentir orgulho, que aos bem-aventurados será defeso. Meu Deus, o olhar das outras avós, com os seus filhotes magricelas ou obesos, a morrerem de inveja do seu maravilhoso neto! E quando você vai embalar o menino e ele, tonto de sono, abre um olho, lhe reconhece, sorri e diz: “Vó!”, seu coração estala de felicidade, como pão ao forno. E o misterioso entendimento que há entre avó e neto, na hora em que a mãe o castiga, e ele olha para você, sabendo que se você não ousa intervir abertamente, pelo menos lhe dá sua incondicional cumplicidade.

Até as coisas negativas se viram em alegrias quando se intrometem entre avó e neto: o bibelô de estimação que se quebrou porque o menininho - involuntariamente! - bateu com a bola nele. Está quebrado e remendado, mas enriquecido com preciosas recordações: os cacos na mãozinha, os olhos arregalados, o beiço pronto para o choro; e depois o sorriso malandro e aliviado porque “ninguém” se zangou, o culpado foi a bola mesma, não foi, Vó? 
Era um simples boneco que custou caro. Hoje é relíquia: não tem dinheiro que pague.

dia 26/07 é o dia dos avós


Livrem-se de toda amargura, indignação e ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade. Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-se mutuamente, assim como Deus perdoou vocês em Cristo.

(Efésios 4:31-32)

domingo, 19 de julho de 2015

aos amigos!


Dei pra me emocionar cada vez que falo dos amigos. Deve ser a idade, dizem que a gente fica mais sentimental. Mas é fato: quando penso no que tenho de mais valioso, os amigos aparecem em pé de igualdade com o resto da família. E quando ouço pessoas dizendo que amigo, mas amigo meeeesmo, a gente só tem dois ou três, empino o peito e fico até meio besta de tanto orgulho: eu tenho muito mais do que dois ou três. São uma cambada. Não é privilégio meu, qualquer pessoa poderia ter tantos assim, mas quem se dedica?

Fulano é meu amigo, Sicrana é minha amiga. É nada. São conhecidos. Gente que cumprimentamos na rua, falamos rapidamente numa festa, de repente sabemos até uma fofoca pesada sobre eles, mas amigos? Nem perto. Alguns até chegaram a ser, mas não são mais por absoluta falta de cuidado de ambas as partes.

Amizade não é só empatia, é cultivo. Exige tempo, disposição. E o mais importante: o carinho não precisa - nem deve - vir acompanhado de um motivo.

As pessoas se falam basicamente nos aniversários, no Natal ou para pedir um favor - tem que haver alguma razão prática ou festiva para o contato. Pois para saber a diferença entre um amigo ocasional e um amigo de verdade, basta tirar a razão de cena. Você não precisa de uma razão, basta sentir a falta da pessoa. E, estando juntos, tratarem-se bem.
Difícil exemplificar o que é tratar bem. Se são amigos mesmo, não precisam nem falar, podem caminhar lado a lado em silêncio. Não é preciso troca de elogios constantes, podem até pegar no pé um do outro, brigar talvez (e porque não!?) delicadamente.
Não é preciso manifestações constantes de carinho, podem dizer verdades duras, às vezes elas são necessárias. Mas há sempre algo sublime no ar entre dois amigos de verdade. Talvez respeito seja a palavra. Afeto, certamente. Cumplicidade? Mais do que cumplicidade. Sintonia? Amor? Esta lengalenga de novo? Sério, só mesmo amando um amigo para permitir que ele se atire no seu sofá e chore todas as dores dele sem que você se incomode nem um pingo com isso.
Só mesmo amando para você confiar a ele o seu próprio inferno. E para não invejarem as vitórias um do outro.
Por amor, você empresta suas coisas, dá o seu tempo, é honesto nas suas respostas, cuida para não ofender, abraça causas que não são suas, entra numas roubadas, compreende alguns sumiços - mas liga quando o sumiço é exagerado. Tudo isso é amizade com trato.

Se amigos assim entrarem na sua vida, não deixe que sumam. Porém, a maioria das pessoas não só deixa como contribui para que os amigos evaporem. Ignora os mecanismos de manutenção. Acha que amizade é algo que vem pronto e que é da sua natureza ser constante, sem precisar que a gente dê uma mãozinha. E aí um dia, abrimos a mãozinha e não conseguimos contar nos dedos nem dois amigos pra valer. E ainda argumentamos que solidão é um sintoma destes dias de hoje, tão emergenciais, tão individualistas. Nada disso.

A solidão é apenas um sintoma do nosso descaso.

20/07 - dia do amigo



Aos anjos que encontrei pelo caminho dei um nome bonito:
Amigos.


... há amigo mais chegado do que um irmão.

Provérbios 18:24b

quarta-feira, 15 de julho de 2015

o homem ideal


“A respiração dela se descontrolava quando ele comandava as reuniões semanais.
As mãos tremiam quando ele aparecia de repente ao seu lado, na máquina de café, e nunca tinha trocado. Ela prontamente emprestava as moedas. Depois voltava para a sua baia e se perguntava se não foi demasiadamente solícita.
Às vezes quando, coincidentemente, subiam no mesmo elevador para o escritório, o mundo parava.
No andar da firma, cada um para o lado, e ela lamentava não trabalharem perto do céu, para a viagem do elevador durar a eternidade.
Ouvia dizer no happy-hour que ele era um galinha e catou algumas estagiárias, secretárias e duas advogadas.
No analista, perguntou se aquela paixão que nascia pelo chefe não era uma óbvia transferência edipiana.
Tudo nele era perfeito.
Atencioso e solteiro!
Sua gravata que combinava, seu sapato sempre engraxado, sua caneta Montblanc reluzente, o Rolex no pulso, como um executivo, para seus padrões, de bom gosto.
Inteligente, rápido, poliglota, sabia usar o pretérito mais-que-perfeito com precisão.
Costumava passar os fins de semana fazendo o quê? Velejando, claro.
A paixão aumentava, sufocava: insônias. Análises minuciosas de cada e-mail trocado profissionalmente, de cada comentário solto em reuniões, para desvendar se ele também sentia algo por ela.
Até procurar um milagreiro que anunciava em folhas coladas nos postes de luz da Marginal, garantindo que, por um preço barato, conseguia enlaçar qualquer paixão não correspondida.
Ela confessou todo o seu desespero para o mago de moletom e camisa do Corinthians, que atendia numa portinhola de uma galeria do Centro.
Nada a perder.
A consulta durou 15 minutos.
Ele deu apenas uma poção em gotas, num invólucro sem nada escrito ou data de validade, e garantiu: “Coloque dez gotas no café dele e terá seu homem garantido até o fim dos dias.”
Charlatão? Toda pinta. Mas cobrou apenas dez reais pela consulta.
O “veneno” incluído. Exigiu que retornasse em dois meses.
O plano foi traçado. Ela sabia do horário em que o metódico chefe passeava pelas baias, e como era o seu café. Postou-se ao lado da máquina com as moedas em mão.
Quando ele se aproximou, ela enfiou as moedas, colocou não dez, mas 20 gotas no copo que a máquina despejou. O chefe então a cumprimentou, descobriu-se sem troco, e ela ofereceu o seu café recém-expelido, ele recusou, ela insistiu.
Ele tomou, não sentiu nada e partiu para a sua ronda.
No dia seguinte, ela recebeu e-mails confusos dele, como de um bêbado em transe.
Não respondeu.
Então, apareceu o chefe na sua baia, com um bombom, ficou ao seu lado e se esqueceu do que iria perguntar e de dar o bombom.
No dia seguinte, a convidou para um almoço. Num hotel. Com vista para a cidade.
Enquanto subiam para o restaurante, ele apertou outro andar. Segurou na sua mão. Desceram antes num corredor cheio de portas e quartos.
Tudo calculado. Reserva já feita. Chave no bolso. Abriu a porta, entraram.
Foi o melhor sexo de suas vidas, confessaram.
Os encontros se tornaram diários. Jantares entraram para a agenda. Almoçavam, jantavam, transavam. Surgiram as caronas. Ele a pegava de manhã. E a levava à noite.
Primeiro foram flores. Vieram perfumes franceses, anéis, colares, relógios.
O chefe mudou a mesa dela para a sua sala. Dizia que não conseguia ficar mais de um minuto sem ela por perto. Beijavam-se em todos os cantos. Ligava-lhe de madrugada, só para ouvir a sua voz.
E nos fins de semana lá ia ela velejar e vomitar com o balanço do mar. Grudados, não havia mais folga. Ele se mudara para a casa dela. Tomavam banhos juntos. Liam os mesmos livros, jornais, revistas, ouviam as mesmas músicas.
Não cabiam mais flores no apartamento, joias nas gavetas, relógios no pulso. Até no cabeleireiro ele ia e esperava, lendo revistas femininas antigas.
Se saía com as amigas, ele ia junto. Se visitava a família, lá estava ele, de mãos dadas, colado.
Dois meses se passaram.
O retorno da visita ao milagreiro.
Ela apareceu na hora marcada, aflita, estressada.
O novo namorado e ainda chefe a esperou na porta.
Quando o mago a viu, disse o que ela queria ouvir:
“Então, veio buscar o antídoto, não aguenta mais?”
Ela teve vergonha de exprimir seu enjoo e arrependimento.
O curandeiro lhe deu outra poção. Num vidrinho de gotas.
E disse: “Pois agora, são outras dez gotas. Mas desta vez, custará duzentos mil.”
Ela pagou.

__Marcelo Rubens Paiva

#dia do homem


Gosto da palavra “amantes”. Amantes são aqueles que se amam. Os amantes, separados pela distância, sentem saudades… Alegram-se com a memória do rosto da pessoa amada. 

Diferente das palavras “marido” e “esposa”. 
Para se ser “marido” e “esposa” não é preciso amar. 

Unidos pela igreja o marido e a esposa têm a permissão – corrijo-me, têm a obrigação de realizar o ato sexual. 
O objetivo da união sexual não é a realização do amor. O amor é sentimento humano. 
O objetivo da união sexual é a procriação. Essa é a lei da natureza.
Já os amantes fazem amor por pura alegria, sem pensar em gerar um filho. 

Amar é brincar. Não leva a nada. Não é para levar a nada. Quem brinca já chegou. 

Fazer amor com uma mulher ou um homem é brincar com o seu corpo. 
Cada amante é um brinquedo brincante. 
“Creio na ressurreição do corpo”: não é a esperança de um milagre escatológico no fim dos tempos. É uma possibilidade de cada dia. 
Os sentidos precisam sair do túmulo onde os deveres os enterraram. 
Corpo de criança, corpo brincante: é nele que acontece a alegria!

O corpo é um lugar maravilhoso de delícias. 


 Alguns a desejar seus beijos de deusa
Outros a desejar seu rabo pra ceia
Óh mundo tão desigual
Tudo é tão desigual 

(A novidade / Paralamas do Sucesso)


Talvez o lugar mais confortável não seja o mais fácil. E talvez o mais fácil não seja o mais desejado. E o mais desejado não seja o mais importante. O mais importante não seja o mais curto. E o mais curto não seja o que tem o caminho mais bonito. Talvez o caminho mais bonito não seja a nossa primeira opção. 

Talvez não seja simples, mas quando se quer, quase sempre é possível.



Ah, meu amor, sossega este peito.
De que adianta querer conjugar o verbo sem o sujeito?
Não há como viver um romance sem coadjuvantes
Sem modos errantes, equívocos e acertos.
Ah, meu amor, a reciprocidade não se pede,
Não se mede: para isto não tem jeito.
Aceite que talvez seja melhor
Escrever uma nova narrativa
Que sossegue este peito.


Vigiai e orai, para que não entreis em tentação.

Mateus 26:41

terça-feira, 14 de julho de 2015


“E é interessante.
O tal do ser humano é interessante.
Sempre procurando o amor definitivo e a tal da segurança.
Logo ele, capaz de morrer no próximo minuto,
sujeito à primeira ventania,
e sem a menor chance diante do menor maremoto.
A segurança, colega, não existe.
A gente inventou.
E isso dói.”

[A vida é bela]